Conheça o artista. Bate-papo com Pedro Lopes


De onde você é e onde vive atualmente?
 
Atualmente vivo em Sorocaba, onde nasci, e onde tenho espaço para trabalhar.
 
Como e quando as artes plásticas entraram em sua vida?

Entraram logo na primeira infância, quando eu me encantava com os desenhos que minha mãe fazia. Ficava fascinado com a ideia de um ser humano ter capacidade de produzir aquelas imagens...
Até o momento que eu consegui fazer os primeiros desenhos que me satisfaziam e então comecei a exercitar isso.

Como você escolheu trabalhar como artista? Teve educação formal em artes plásticas?
 
Sempre exerci isso de uma forma ou de outra, como recorrência pessoal. Minha pretensão era estudar exatas, fazer Física. Logo na época do científico descobri que aquilo que mais me chamava a atencão eram as formas das equações e dos desenhos vetoriais, em vez de seu significado ou de sua prática.
 
Estudei com alguns pintores aqui de Sorocaba e depois fui para São Paulo, onde cursei a faculdade de Belas Artes e lá lecionei por dez anos. Durante esse tempo passei a produzir e, a partir daí, fui desenvolvendo minha carreira.

Qual sua primeira memória de estar criando?
 
Minha primeira memória de estar criando é aquilo que eu chamo de “primeiro quadro”. Um quadrinho que tenho aqui, uma pequena natureza morta que pintei no início dos anos 60.

Do que você necessita quando está criando?
 
Quando estou criando necessito sempre estar atento, concentrado naquilo. A partir dessa atenção e concentração total, minha imaginação se desenvolve...
A medida que vou concretizando o trabalho a própria imaginacão vai dando conta de mudar essas expectativas e mudar esses formatos e soluções – sempre conectada àquela primeira ideia que semeou o trabalho.




Como é um típico dia em seu espaço de trabalho? Como é ter seu ateliê em casa?
 
Ter ateliê em casa significa que o tempo todo eu passo aqui, olho para as coisas e vou me inteirando delas. Isso acaba sendo um processo contínuo.
Há uma característica, que de certa forma me incomoda, mas não consigo me livrar: eu só consigo engrenar no trabalho, me aprofundar nele, na medida em que está tudo bagunçado. Eu arrumo o ateliê e, no momento em que está tudo arrumado, eu não consigo fazer nada.
Começo a mexer e percebo que, conforme vou distribuindo as tintas, os pincéis, distribuindo tudo que vou precisar para trabalhar, tudo volta para aquele primeiro momento, quando comecei a me inteirar daquilo.
Então, quando está tudo bagunçado o trabalho começa a fluir. Na realidade meu trabalho começa quando estou criando esse ambiente e só vai se configurar depois, quando a pintura começa a se desenvolver.

Seus trabalhos têm uma linguagem que caminha entre a geometria e abstração, em geral com uma mistura de cores fortes. Você também tem trabalhos figurativos. Como encontrou sua linguagem?
 
Eu sempre parti da figuração. A abstração nasce da figuração. É diferente do abstrato. O abstrato é um jogo formado em si: ele nasce de um jogo, da forma com ela mesma, dos próprios formatos.
A abstração parte de uma imagem, de uma situação observada, ou de uma imagem representativa de uma realidade vivida. E a partir daí começo a trabalhar fazendo um exercício de linha, de forma e de cor e aos poucos vou me libertando da representação para me ater somente na relação entre as formas. A busca é sempre a escolha dos formatos e cores: eles vão dizer melhor aquilo que eu estava querendo dizer...


 
Como é o uso/escolha de cores no seu trabalho? Têm preferências? Cores que não usa?  E do suporte? Por que o uso de papelão e jornal? 
 
O que determina o trabalho, o que determina a cor é exatamente aquilo que eu queria dizer, ou seja, o impulso que gerou a ação de pintar. Automaticamente vem a ideia da cor junto.
Principalmente agora que estou fazendo uma abstração geometrizada, aquilo que vai dizer, dar o clima, ser a expressão do trabalho são exatamente as cores, a relação das cores. As escolho no primeiro momento, ao conceber o trabalho: determino um leque de cores geral e então vou desenvolvendo e trabalhando nos ajustes, fazendo as descobertas das soluções finais, e tudo vai acontecendo.
Em relação aos materiais também é a ideia principal que determina sua escolha. É nessa fase que escolho os materiais. Escolho o papelão e o jornal para trabalhar, por exemplo, exatamente porque esses materiais são extraídos do dia a dia, diferente dos materiais chamados “materiais artísticos”, que pertencem somente à esse mundo da arte. Esses materiais, o papelão e o jornal, são extraídos da realidade não artística, da realidade vivida. Assim, a relação do trabalho e seu tema se torna mais estreita. O material já é o próprio trabalho. No caso do jornal, utilizo em geral as cores preta, branca e cinza – a cor vem do próprio fundo do jornal.

Nos fale um pouco sobre a importância da espontaneidade x planejamento no seu processo criativo. 
 
Procuro me planejar. A espontaneidade vai sair da transgressão do planejamento, quando o próprio planejamento aponta para um salto criativo. Eu planejo tudo para depois ter um insight e não simplesmente querer criar e já copiar a ideia. A ideia é submetida ao planejamento primeiro, e só depois é que a forma passa a dizer; e, então, vem o salto da espontaneidade.
 
Qual a parte mais difícil do processo criativo para você?
 
A parte mais difícil é exatamente esse momento em que está tudo planejado, já tenho uma perspectiva do resultado final e, quando esse planejamento se realiza, sinto que ainda não é aquilo que me satisfaz. Nesse momento fico submetido ao acaso, que é exatamente o salto criativo. Essa expectativa é a parte mais difícil, porque a partir daí você não sabe mais o que vai acontecer. E é esse não saber o que vai acontecer que dá vida ao trabalho, que dá dinâmica.
Costumo dizer que na arte você nunca faz o que sabe. Você usa o que sabe para fazer e atingir aquilo que não sabe. Se você usar o que sabe e o resultado for somente aquilo que já sabia, então você não atingiu esse estágio da multiplicidade de interpretação ou expressão que chamamos de arte.


 
Quando você sabe que uma obra está finalizada?
 
Justamente quando surge o elemento que determina o salto criativo; isso me diz que a obra se realizou.

Por quais artistas você é influenciado e/ou admira? É influenciado por algum(a) que desenvolve um trabalho completamente diferente do seu?
 
Geralmente eu admiro os artistas que têm trabalhos completamente diferentes do meu. Três artistas que admiro muito: Matthias Grünewald, Rembrandt e Josef Albers. Embora ache que o trabalho de nenhum deles tenha a ver com meu, são artistas de que gosto muito. No caso de artistas brasileiros, são muitos... Entre eles, Iberê Camargo e José Antônio da Silva.
Da arte contemporânea, talvez o artista que eu mais admire seja Thomas Hirschhorn, porque para mim seu trabalho faz parte desse constante acaso, e desse constante vir a ser.

 

Veja AQUI os trabalhos do artista no site!

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